UM OLHAR HISTÓRICO SOBRE O PAPEL DAS TECNOLOGIAS: DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL À REVOLUÇÃO DIGITAL

Artigo apresentado a Disciplina de Educação Brasileira – FACED – UFC – PPGE

Antonia Lis de Maria  Martins Torres

Sinara Socorro Duarte Rocha

Bruna Rafaela Araújo da Silva

Marcos Antonio Rocha de Lima

RESUMO

O objetivo deste ensaio foi compreender o papel das tecnologias na educação pelas quatro revoluções industriais. O estudo tem como seguinte questão problema: Qual o papel das tecnologias para a evolução da educação? Caracteriza-se como um estudo bibliográfico e descritivo, com abordagem qualitativa. Quanto ao seu objetivo, almeja compreender o papel das tecnologias na educação desde as sociedades primitivas até a contemporaneidade. A análise desse contexto histórico mostrou que a educação e o uso de recursos tecnológicos evoluem conforme as necessidades da sociedade e as culturas, sendo o papel das tecnologias atrelados às demandas sociais. Independentemente do tempo, as necessidades se transformam, mas o papel das tecnologias ainda é proporcionar uma melhor qualidade de vida. Apesar dos avanços, o Brasil ainda não acompanha esse desenvolvimento tecnológico sendo a escola brasileira um subproduto do industrialismo.

Palavras-chave: História da educação. Tecnologias. Educação Brasileira. Revolução Industrial.

Introdução

Este artigo é um ensaio sobre a história da educação, enfocando o papel das tecnologias desde a primeira revolução industrial até a revolução digital tendo como objetivo refletir sobre a importância das tecnologias ao longo da história da educação, destacando o papel docente desde as sociedades primitivas até a contemporaneidade. Nesse sentido, este ensaio busca responder a seguinte questão problema:  qual o papel da tecnologia e como esta pode influenciar a prática docente do ponto de vista histórico?

A metodologia foi a pesquisa do tipo qualitativa, com coleta de dados bibliográfica, com aporte de autores que versam sobre a relação educação e tecnologia (GIL, 2008). A pesquisa qualitativa envolve uma abordagem interpretativa do mundo, o que significa que seus pesquisadores estudam as coisas em seus cenários naturais. Ainda, segundo Gil (2008), por pesquisa bibliográfica, entende-se a leitura, a análise e a interpretação  de fontes secundárias, ou seja, livros, artigos que já foram publicados na literatura trazendo sobre a temática. 

Inicialmente é apresentado a educação desde as sociedades primitivas até a revolução 4.0, doravante, denominada digital e suas repercussões para a sala de aula. 

2 A educação desde as sociedades primitivas à Revolução Industrial 1.0

Na contemporaneidade, as sociedades ocidentais são caracterizadas pelo grande desenvolvimento e incorporação da tecnologia digital de comunicação e informação (TDIC), no cotidiano. É difícil o mundo e a sociedade, sem os benefícios da tecnologia digital. 

Inicialmente é oportuno esclarecer o significado do termo tecnologia digital. Etimologicamente, a palavra tecnologia vem do grego “tekhne“, significando “técnica, arte, ofício”, juntamente com o sufixo “logia“, que indica estudo e conhecimento. Muitas vezes associada a ferramenta, o termo contempla uma definição mais complexa, portanto, a tecnologia seria “o conjunto de processos, métodos, técnicas e ferramentas relativas a uma área do conhecimento humano em diferentes áreas.” (MICHAELIS, 2020, online).

Para Lévy (1999, p. 20), “tecnologia é o produto de uma sociedade e de uma cultura.” Seria, portanto, tudo aquilo que foi produzido pelo conhecimento humano, criado e utilizado de forma a satisfazer as necessidades humanas. Desta forma, tudo que vem do ser humano é tecnologia, enquanto tudo que vem da natureza é natural. 

A linguagem, a técnica de fazer fogo, roupas, óculos, alimentos, relógios, calendário, muitas são invenções humanas. Na educação não seria diferente. O lápis, o giz, o papel, o livro didático, o projetor são exemplos de tecnologia que inicialmente não foram projetadas para o meio educacional, mas que foram adaptadas para esse fim. 

Já o termo digital vem do latim digitus que significa dedos, ou seja, é tudo que pode ser contado pelo sistema decimal. Tecnologia digital seria tudo aquilo que pode ser transformado em linguagem binária (0 e 1) de computador, como afirma Ribeiro (2018).

Nesse contexto é oportuno lembrar que a adoção de determinada tecnologia educacional depende mais do contexto histórico-social, do que propriamente da vontade pessoal de uma comunidade ou indivíduo. As sociedades primitivas, por exemplo, eram agráfas, ou seja, não faziam uso de alfabeto, apenas da oralidade, pois o modo de produção era o comunismo primitivo. Tudo que era coletado era dividido e imediatamente consumido entre o grupo social, não havia sobras nem excessos. A tecnologia se resumia à produção de ferramentas rudimentares, feitos com objetivo de subsistência e defesa.

Com o surgimento da escrita na Antiguidade, nossa sociedade foi aos poucos tornando-se gráfica. A tecnologia evoluiu da manufatura para a tecelagem enquanto que as técnicas agrícolas e de pecuária nos tornaram sedentários. Nesse período, o trabalho era baseado na aptidão física e a capacidade de produção inicial era bastante limitada. 

A educação da época respondeu às necessidades da sociedade agrícola, sendo, portanto, de cunho familiar-tutorial, ou seja, repassada de pai para filho. As crianças aprendiam com os próprios pais o ofício. No Brasil, no período pré-cabralino, não era diferente. Nosso país era habitado por uma diversidade de povos e línguas. A educação ocorria dentro das aldeias, de forma coletiva e para o bem de todos. A tecnologia existente era o domínio do fogo, as técnicas de caça e culinária que variavam de aldeia para aldeias com objetivo de subsistência. A chegada dos portugueses e a revolução industrial ocorrida originalmente na Europa vai modificar esse contexto educacional. 

As transformações da natureza e o surgimento de novas tecnologias foram ficando mais intensas levando a Europa, com destaque para a Inglaterra no final do século XVIII a se tornar uma grande potência e modificar o modo de produção e consequentemente a sociedade. 

No final do século XIX, ocorreu a primeira Revolução Industrial, também denominada de Indústria 1.0, graças à invenção de máquinas movidas à calor e, não mais à força humana e sua aplicação na indústria.  Aproveitando a energia do carvão mineral e do vapor a sociedade tornou-se cada vez mais consumista, aumentando a produção de mercadorias e modificando nossa forma de se transportar. É o surgimento de trens e carros ampliando a possibilidade de translados mais rápidos de pessoas e mercadorias.   

É o início da urbanização das cidades, demandando da sociedade, um local para instrução da grande massa de trabalhadores advinda das zonas rurais: nasce o modelo de escola, baseado nas fábricas (SAVIANI, 1986).  Tem-se então a educação 1.0, destinada aos mais abastados onde os recursos didáticos disponíveis eram escassos como lousas e giz predominando a oralidade, o prestígio e a eloquência do mestre como autoridade máxima e detentor do conhecimento, o aluno era visto como ser passivo que deveria ser obediente às normas vigentes na sociedade.

No Brasil, a revolução industrial chegou de forma tardia, ocorrendo de forma diferente do modelo europeu, visto que o capital e a tecnologia foram importados de empresas estrangeiras. Nesse período, estudar era um privilégio destinado às classes altas como os filhos dos senhores de engenho, ou seja, aqueles que não tinham necessidade de trabalhar para garantir sua sobrevivência. 

Com as Capitanias Hereditárias houve a migração de um pequeno contingente de portugueses para o Brasil, fazendo surgir uma nova classe social: a pequena burguesia brasileira. A necessidade de controle de bens e mercadorias, “por ordem” da colônia nas cidades, surgiu nas escolas de primeiras letras (1827-1890) para os filhos dos portugueses. Escravos, negros mesmo alforriados, mulheres, indígenas e estrangeiros, brancos empobrecidos era negado o acesso a escolarização. 

No período colonial, aliado aos interesses financeiros haviam também os interesses religiosos de moralizar a população de “desvalidos” e gentios fazendo com que a Igreja Católica  tivesse o monopólio da educação, principalmente no Brasil. 

A educação jesuítica se baseava na moral cristã europeia do Ratio Studiorum, ou seja, na forte disciplina e na doutrinação católica além do ensino das primeiras letras. Nesse período a educação era destinada à nobreza, com forte influência da Igreja Católica predominando a corrente liberal tradicional (LIBÂNEO, 2010). Nesse modelo a relação professor e aluno é hierarquizada, no qual adulto é superior que ensina ao inferior (aluno), tido como “tábula rasa”, uma folha de papel em branco, que aprende mediante a instrução e em clima de forte disciplina, ordem, silêncio e obediência em relação aos valores vigentes. 

A ascensão para o império, pouco mudou a realidade educacional brasileira. A educação continou nas mãos das elites e a escravidão já não era um negócio lucrativo, dado o crescimento do movimento abolicionista que perdurou até as vésperas da República em 1888. 

Segundo Saviani (2010) a primeira legislação educacional data de 15 de novembro de 1827, a qual determinava a criação de Escolas de Primeiras Letras, a qual deveria ser implantada em cidades, vilas e locais populosos O método adotado deveria ser o ensino mútuo de Lancaster. O conteúdo a ser oferecido pelos professores deveria ser leitura e escrita, operações básicas de aritmética, gramática nacional e os princípios da moral cristã. 

Com a adoção do método Lancaster, oficializado pelo ato imperial de 1827, esperava-se difundir o ensino primário, rapidamente a baixo custo. Ao final deste período, Saviani (2010) reitera a ineficiência desse método no no século XIX,  devido ao despreparo e pouca dedicação dos professores, baixa remuneração,  ausência de instalações físicas, fiscalização por parte das autoridades de ensino e sobretudo a prática inadequada do ensino mútuo.

Inicialmente no Brasil a formação de professores ocorria nas chamadas Escolas Normais que era destinada ao público masculino. A primeira escola normal foi criada em Niterói (RJ) em 1835, Bahia (1836), no Ceará (1844). Tais instituições de ensino nascem com o intuito de disseminar interesses da elite conservadora no Brasil com pouca preocupação pedagógica. O intento das elites era “domesticar” a população segundo Sobral, Araujo e Gonçalves (2019, p.448), pois “a utilização do método Lancaster imposto pelos conservadores para os  normalistas, nos traz indícios da falta de compromisso com a instrução do povo, pois esse método foi bastante criticado por sua ênfase em hábitos disciplinares e de hierarquia”.

Poucos eram os recursos tecnológicos nas escolas, predominando unicamente a oralidade e em casos raros, o livro didático, que era item exclusivo do professor. Quanto à metodologia, predominava a educação tradicional, com o professor como único detentor do conhecimento, a valorização da memorização e da disciplina rígida nas escolas. 

O século XX traz consigo novos desafios, entre eles, a necessidade de industrialização da economia e um novo regime de governo: a República, que irá impactar a formação de professores. 

3 A Educação na Revolução Industrial 2.0

A segunda Revolução Industrial, também chamada de indústria 2.0, marca o início do século XX com o advento de novos recursos energéticos como petróleo e eletricidade para uso residencial e industrial. 

Em paralelo ao surgimento de novas fontes de energia, temos o desenvolvimento tecnológico, principalmente dos meios de comunicação como o telefone, o rádio e a televisão disseminando o modelo econômico capitalista vigente para o resto do mundo. É o início da produção em massa e das linhas de montagem que vão influenciar diretamente o modelo de escola (SAVIANI, 2010).

A crescente industrialização após a Segunda Grande Guerra Mundial influencia a defesa de uma educação tecnicista. A escola é idealizada no modelo taylorista-fordista caracterizada pela possibilidade de homogeneizar a sociedade, com um único professor a ensinar dezenas de alunos ao mesmo tempo, como numa linha de montagem, respondendo às necessidades do mercado de trabalho. 

O objetivo era adequar-se às exigências da sociedade industrial, formando mão de obra eficiente e acrítica. Bianchetti e Palangana (2000, p.43) aclaram que “[…] a preparação para o trabalho surge pois como o seu principal objetivo, enquanto a questão do conhecimento permanece relegada para um plano secundário”. Neste modelo pedagógico, a escola adota os mesmos elementos de gerenciamento fabril. Algumas características são “a hierarquização de autoridade, centralização do poder, leis mais rígidas, parcelamento do trabalho, especialização, divisão entre o trabalho de planejamento e execução, dentre outras” (CAVALCANTI, HOLANDA, TORRES, 2018, p.4). O professor é o especialista, o elo entre os conhecimentos científicos, tornando-se o “técnico” responsável pela eficiência do ensino enquanto o aluno é passivo, por meio do “aprender a fazer”, pois o foco é a técnica.  

Segundo Saviani (2010) durante o Regime Militar, nos anos de 1960, o Ministério da Educação brasileiro (MEC) firmou convênios com a United States Agency for International Development (USAID) com o intuito de garantir assistência técnica e cooperação financeira à educação brasileira. Esses acordos objetivam mudanças no sistema educacional brasileiro, desde o então ensino primário, atual fundamental, até o nível superior. Inicialmente reformou-se o nível superior, por meio da Lei nº 5.540/68. Em seguida, os ensinos primário e secundário agora são unificados em 1° grau pela Lei nº 5.692/71. O ginásio se torna 2° grau antes dividido em clássico, científico e normal, que agora recebe uma nova nomenclatura habilitação para o magistério formando docentes para a docência nos anos iniciais do 1° grau. 

No Brasil somente nos anos 1970 do século XX esse modelo de escolarização é adotado. O modelo brasileiros ligados à educação profissional implementado no período ditatorial tinham um cunho dualista, isto é, com viés profissionalizante para a classe trabalhadora e propedêutica para as elites que deveriam gerir o país.

Na era fabril, surge a educação 2.0, ou seja, torna-se um ideal coletivo, de ensino das massas de trabalhadores e escolas de ensino profissional. No que diz respeito aos recursos tecnológicos surgem, canetas, lápis de desenho, livros didáticos, enciclopédias, álbum seriados recheadas de ilustrações, mapas, dicionários, réguas, calculadoras, aparelhos toca fitas, rádios, televisão, videocassetes, parabólicas, dentre outros, além de novos espaços escolares como laboratórios de ciências, bibliotecas e salas de mecanografia com máquinas de escrever, mimeógrafos, uma espécie de copiadora, tudo para facilitar a aprendizagem.  

Nesse período surgem novos debates acerca do papel da escola e do professor com tendências progressistas de cunho libertadora (FREIRE, 1991) e crítico-social (SAVIANI, 1986), focadas nos interesses discentes e na realidade social. 

Os anos 80 juntamente com novos ares de redemocratização contribuíram para a mudança na política e na educação nacional. A década de 1990 marcou o avanço do neoliberalismo no Brasil e no mundo, influenciando uma nova LDB (93941 de 1996) tornando a exigência de ensino superior para todos os professores. A proximidade com o novo milênio e o acesso às tecnologias emergentes como computadores evoluem cada vez mais rápido, dando lugar  a informática e consequentemente a terceira revolução industrial: 3.0 

4 Educação na Revolução Industrial 3.0 e o papel das tecnologia 

A terceira revolução industrial, ou indústria 3.0, surge no final do século XX com o advento de computadores e, obviamente, o nascimento da Internet. Na sociedade globalizada há o aumento da produção de bens de consumo, surgimento de blocos econômicos e redução de custos pela exploração de mão de obra barata em países subdesenvolvidos, localizados na Ásia. 

Outra característica desse período é o avanço tecnológico dos meios de comunicação, bem como seu manuseio e compartilhamento, além do aumento da concorrência profissional e a valorização da mão de obra qualificada, diante de uma nova demanda: a chegada da robótica e da automação. 

Surge a educação 3.0 ainda mais voltada para o mercado de trabalho e a formação de mão de obra. Novos recursos didáticos são adicionados a sala de aula, cada vez mais tecnológicos, como o computador, os projetores e os softwares educativos. O professor deixa de usar a máquina de escrever dando lugar ao editor de texto, no lugar de transparências, os slides em telas de projetores. No lugar das fitas cassetes, vídeos no You Tube. No lugar de pesquisas na biblioteca, acesso à internet. É a chegada dos laboratórios de informática Educativa (LIES) nas escolas, uma forma de fazer a inclusão digital, agora,uma necessidade do mundo do trabalho, afinal não ser alfabetizado digital compromete o futuro do estudante. 

Para Rocha (2009, 2013) o uso do computador como ferramenta pedagógica é um privilégio advindo da Informática Educativa, auxiliando na construção do conhecimento. Nessa perspectiva o computador deve ser usado como um meio de suporte à aprendizagem a partir de uma reformulação do currículo.

No final do século XX, há um crescimento acelerado de cursos superiores na modalidade a distância e cursos presenciais com carga horária online, os chamados semipresenciais, inicialmente na rede privada, posteriormente na rede pública por meio de programas específicos como a Universidade Aberta do Brasil. 

A chegada do novo milênio traz em jogo a necessidade de uma formação mais preocupada com a integração teoria-prática com foco em metodologias cada vez mais interativas.  No que diz respeito à formação docente, em 2002 foram promulgadas as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores – CNE/CP 01/2020. Fica evidente a preocupação com os conteúdos pedagógicos específicos da docência como educação especial, educação etno-racial, direitos humanos, educação ambiental. O professor é mais que um especialista em conteúdos, uma crítica direta ao modelo anterior da racionalidade técnica, exemplificado pela formação “3+1” . 

Nas licenciaturas são cada vez mais valorizadas as dimensões ensino, pesquisa e extensão que devem ser desenvolvidos por meio da reflexão sobre a prática aumentando consideravelmente a carga horária de formação docente, a saber: por 400 horas de Prática como Componente Curricular (PCC), 400 horas de estágio curricular supervisionado, 1800 horas de aulas para os conteúdos curriculares de natureza científico-cultural e 200 horas para outras formas de atividades acadêmico-científico-culturais..

Recentemente foi aprovada a Resolução CNE/CP 2/2019 que “define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica” instituindo a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores (BNC-Formação). O documento reforça o caráter de articulação entre teoria e prática na formação, propõe a adequação dos cursos à Base Nacional Comum Curricular (BNCC) aprovada em 2018.

A BNCC (2018) é o documento normativo de referência que orienta o currículo escolar das escolas brasileiras definindo as aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver, sendo organizada por meio de habilidades e competências que devem ser estimuladas ao longo da educação básica. Ao definir os fundamentos pedagógicos apresenta 10 competências gerais que devem ser orientados os currículos da educação básica, a saber: Conhecimento, Pensamento Científico, Crítico e Criativo, Repertório Cultural, Comunicação, Cultura Digital, Trabalho e Projeto de Vida, Argumentação, Autoconhecimento e Autocuidado, Empatia e Cooperação e por fim Responsabilidade e Cidadania. 

A resolução Nº 02, de 22 de dezembro de 2017, aprovada pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), institui e orienta a implantação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) a ser respeitada obrigatoriamente ao longo das etapas e respectivas modalidades no âmbito da Educação Básica. Pode-se observar uma maior preocupação com o desenvolvimento de competências pessoais, sociais e profissionais necessárias para a atuação docente. Especificamente se destacam as competências 4 e 5, que apontam o papel fundamental da tecnologia na formação do educando:

4.Comunicação — Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das linguagens artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo.
5.Cultura Digital — Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva. (BRASIL, 2018, p.13)

 O aluno deve ser capaz de compreender o impacto da cultura digital na vida pessoal e na sociedade, fazendo uso consciente e ético da tecnologia para se comunicar em diferentes linguagens. As demais competências embora não citem de forma diretamente o digital, a mesma se faz necessária para sua efetivação. A cultura digital aparece de forma transversalizada em diferentes componentes curriculares não estando atrelada a uma disciplina específica o que pressupõe sua obrigatoriedade nos currículos de formação docente.

Educação na Revolução Industrial 4.0

Chegamos no ano de 2020 com tecnologias móveis conectadas à internet sem fio gerando intensas mudanças sociais e nas formas de aprender. Países como Japão, China e Alemanha já adotam em seus processos educativos conceitos ligados à robótica e a computação em nuvem no início do século XX. 

É chegada a quarta revolução industrial, ou melhor, a indústria 4.0, termo inventado pelos alemães em 2011, para se referir às fábricas inteligentes e às tecnologias emergentes que adotam inteligência artificial (IA) e a robótica em processos de fabricação. É o mundo real se conectando cada vez mais com o mundo virtual, se misturando em uma nova realidade, permitindo a fusão dos mundos físico, digital e biológico. A ficção científica deixa de ser imaginação para se tornar realidade. São exemplos dessas inovações: a realidade aumentada, a IoT – Internet das Coisas, a Big Data, a Manufatura Auditiva (MA), a Computação em nuvem, a Biologia Sintética, a neurotecnologia e os Sistemas Ciber Físicos (CPS) dentre outros. 

Esse cenário se agrava quando mencionamos o mercado de trabalho, ampliando a defasagem entre o que é ensinado na escola e o que é esperado nas empresas que migram rapidamente para o virtual. Atrás da aparente inocência da tela de um celular há um potencial incalculável de oferta de produtos e serviços aliado a uma infinidade de recursos para comunicação em rede. Vivemos sob um novo signo: da cultura digital. Estamos nos tornando seres híbridos, convivendo nem sempre pacificamente em dois habitats, o virtual e o real, produzindo um novo tipo de cultura: a cibercultura. 

Num mundo cada vez mais cibernético, redes neurais de aprendizagem artificial  como Learning Machine (aprendizagem de máquina) e Deep Learning (aprendizagem profunda), formas avançadas de programação tomam corpo. De forma simplista, uma aprendizagem de máquina ocorre de forma autônoma, no qual algoritmos que são capazes de fazer predições permitindo que objetos físicos sejam conectados à rede mundial de computadores e coletem padrões de forma remota, personalizando o mundo físico e o digital. As recomendações da Netflix, plataforma virtual de filmes e as dicas de compras do Google são exemplos dessa prática. Ainda é cedo para prever todos os impactos desta quarta revolução industrial diretamente na educação.

A educação 4.0 se baseia no princípio que a aprendizagem deve ser focada no Learning by doing, ou seja, aprendizagem por experimentação. Autores contemporâneos como Bachic e Moran (2018), Filatro e Cavalcanti (2020), Borges Neto (2017), Mill (2013) têm demonstrado que as nossas escolas carecem de uma educação inovadora, ou seja, o aluno não mais um ser passivo mas como protagonista e pesquisador de sua aprendizagem, as chamadas metodologias inovativas.

O conceito de metodologias ativas não é novidade, surgiram no início do século XX, com os ideais  da Escola Nova (1930) focados no pragmatismo de Dewey (1916) e no interesse do aluno em aprender por descobertas e experimentação de Kolb (1984). A aprendizagem é estimulada por meio da reflexão, das experiências, pesquisas, projetos e atividades significativas pautadas na autonomia e criatividade discente. Como diz Moran (2017, p.38): “a aprendizagem ativa aumenta a nossa flexibilidade cognitiva, que é a capacidade de alternar e realizar diferentes tarefas, operações mentais ou objetivos e de adaptar-nos a situações inesperadas, superando modelos mentais rígidos e automatismos pouco eficientes.”

É oportuno comentar que no cenário local, a pedagogia “mão no bolso”, um dos princípios  da Sequência Fedathi, propostas pelo educador brasileiro Borges Neto (2017)em meados da década de  80,  já  sugeria esse modelo de educação voltado para o aprender, por meio da mudança da postura docente, da reflexão sobre a ação e do protagonismo discente.

São diversos os modelos de metodologias ativas disponíveis, entre as quais a problematização, a aprendizagem baseada em problemas, aprendizagem baseada em projetos, ensino híbrido, sala de aula invertida, dentre outras. O sucesso de qualquer uma delas, no entanto, depende de uma radical mudança na atuação do professor em sala de aula, em que o professor torna-se mediador do processo de ensino e aprendizagem. Há a necessidade de se repensar os modelos pedagógicos vigentes buscando a reflexão e que demanda abertura e flexibilidade de currículos, superando a ideia de que ensinar é transferir conhecimentos. 

Especula-se a existência de uma quinta geração futuramente onde a aprendizagem seja imersiva, os chamados metaversos, um mundo virtual onde o indivíduo poderia replicar as mesmas experiências do mundo real. Para Claro (2022, p.1) o metaverso, portanto, é “a junção da realidade aumentada com a virtual, combinando o mundo digital com o material, e tudo nele acontece em tempo real.” Para o autor, o conceito de metaverso não é algo novo. Existem ambientes virtuais nos quais é possível, além de jogar, interagir com outros usuários, socializar, assistir a shows, ir a exposições, entre outros. Os usuários são representados por avatares, que podem ter características físicas semelhantes aos do usuário na vida real ou podem representar algum personagem fictício, como um monstro ou uma fada, por exemplo. Na educação esse conceito ainda é pouco explorado, mas apresenta inúmeras possibilidades para o amanhã.  

Considerações finais

O presente artigo teve como objetivo geral refletir sobre a importância das tecnologias ao longo da história da educação, destacando o papel docente desde as sociedades primitivas até a contemporaneidade.

Partindo dessa premissa, as evidências históricas apresentadas neste artigo, aclaram as mudanças ocorridas nas sociedades no que diz respeito ao uso de recursos tecnológicos no cotidiano, que outrora em seus primórdios eram usados apenas para resolver problemas do dia a dia passando posteriormente a integrar o contexto educacional, onde permanece no período atual e tem-se a perspectiva de que novas gerações continuem a inovar. Com o intento de compreender o papel das tecnologias na educação, essa pesquisa foi desenvolvida baseada em materiais já elaborados, classificando-se como bibliográfica, e exploratória quanto ao seu objetivo. 

Apartir das reflexões deste ensaio concluímos que embora a História nos ensine que as revoluções tecnológicas andam de mãos dadas com as revoluções sociais, a maioria das salas de aula brasileiras ainda não acompanharam esse desenvolvimento tecnológico. Nossa escola atual é um subproduto do industrialismo, idealizada na concepção da linha de montagem da primeira revolução industrial, e portanto, estamos atrasados há quase um século, pois ainda não resolvemos problemas básicos como o acesso universal à escolarização e o acesso a Internet de qualidade nas escolas brasileiras. Poucas conseguiram desenvolver de fato, uma “educação 4.0” voltada para inovação, cooperação e incorporação da tecnologia nos currículos escolares. A desigualdade social agora é alimentada por um novo dado: o acesso à tecnologia educacional digital de qualidade. 

A pandemia de Covid-19 (2020-2021) deixou isso bem claro o grande fosso entre as escolas públicas e privadas, ao mostrar o despreparo para lidar com as questões ligadas à tecnologia educacional. 

Pode-se afirmar que, a análise desse contexto histórico mostrou que a educação e o uso de recursos tecnológicos evoluem conforme as necessidades da sociedade, sendo o papel das tecnologias atrelados às demandas sociais. Independentemente do tempo, as necessidades mudam mas o papel das tecnologias ainda é proporcionar uma melhor qualidade de vida. Apesar dos avanços, o Brasil ainda não acompanha esse desenvolvimento tecnológico sendo a escola brasileira um subproduto do industrialismo.

REFERÊNCIAS

BACICH, Lilian; MORAN, José. Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Penso Editora, 2018.

BIANCHETTI, L.; PALANGANA, I. Sobre a Relação Histórica entre Escola e Sistema Produtivo: Desafios Qualificacionais. Boletim Técnico do Senac, v. 26, n.2, p.40-51, 2000.

BLOOM, B. S. et al. Taxonomy of educational objectives. New York: David Mckay, 1956, 262. p. 

BORGES NETO, H. Sequência Fedathi além das ciências duras. Curitiba: CRV, 2017.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. 2018. Disponível em: <http://basenacional comum.mec.gov.br/> Acesso 10.06.2022.

BRASIL. Lei 5540 de 1968. Fixa normas de organização e funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola média, e dá outras providências. Disponível em <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1960-1969/lei-5540-28-novembro-1968-359201-publicacaooriginal-1-pl.html> Acesso em 16.06.2022.

BRASIL, Lei 5692 de 1971. Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus, e dá outras providências. Disponível em <https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/128525/lei-de- diretrizes-e-base-de-1971-lei-5692-71> Acesso em 16.06.2022.

BRASIL, Lei 9394 de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm> Acesso em 17.06.2022.

BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 27 DE OUTUBRO DE 2020. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Continuada de Professores da Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Continuada de Professores da Educação Básica (BNC-Formação Continuada). Acesso em <https://www.in.gov.br/en/web/ dou/-/resolucao-cne/cp-n-1-de-27-de-outubro-de-2020-285609724> acesso em 25.06.2022.

BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 2, DE 22 DE DEZEMBRO DE 2017. Institui e orienta a implantação da Base Nacional Comum Curricular, a ser respeitada obrigatoriamente ao longo das etapas e respectivas modalidades no âmbito da Educação Básica. Acesso em <https://normativasconselhos.mec.gov.br/normativa/view/CNE_RES_CNECPN22017.pdf?query=curriculo> acesso em 25.06.2022.

BRASIL. RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 2, DE 22 DE DEZEMBRO DE 2019. Define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação). Acesso em <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao- n-2-de-20-de-dezembro-de-2019-*-242332819> acesso em 25.06.2022.

CAVALCANTI, M. J. M. ; HOLANDA, P. H. C. ; TORRES, A. L. M. M. A perspectiva de Educação Aberta desenvolvida pelo Laboratório de Pesquisa Multimeios/FACED/UFC.In: organização de Maria Juraci Maia Cavalcanti, Patrícia Helena Carvalho Holanda, Antonia Lis de Maria Martins Torres. (Org.). : Tecnologias da Educação: passado, presente e futuro /organização. 1ed.Fortaleza: Edições UFC, 2018, v. 1, p. 1-343.

CLARO, M. Metaverso e os possíveis impactos na educação. ML notícias em EaD. 2022. Disponível em <https://www.noticiasead.com.br/noticias/5665-metaverso-e-os-possiveis- impactos-na- educacao> Acesso em 10.05.2022.

DENZIM, N.K.; LINCOLN, Y. S. O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006.

FILATRO, Andrea; CAVALCANTI, Carolina Costa. Metodologias Inovativas na educação presencial, a distância e corporativa. Saraiva: 2018. 

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Paz e Terra, 1991.

GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

Kolb, D. A. (1984). Experiential learning: Experience as the source of learning and development. New Jersey: Prentice-Hall.

LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999.

LIBÂNEO, J. Adeus professor, adeus professora?Novas exigências educacionais e profissão docente. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

MICHAELIS. Dicionário online. 2020 Disponível em < https://michaelis.uol.com.br/> Acesso em 10.05.2022.

MILL, Daniel. Escritos sobre educação: desafios e possibilidades para ensinar e aprender e possibilidades tecnopedagógicas. São Paulo: Papirus, 2013.

MORAN, Jose. Metodologias ativas e modelos híbridos na educação. Novas Tecnologias Digitais: Reflexões sobre mediação, aprendizagem e desenvolvimento. Curitiba: CRV, p. 23-35, 2017.

RIBEIRO, Ana Elisa F. Tecnologia Digital. In: FRADE, Isabel C. A. S.; VAL, Maria G. C.; BREGUNCI, Maria G. C. (Orgs.). Glossário CEALE: Termos de Alfabetização, Leitura e Escrita para Educadores. Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita – CEALE. Faculdade de Educação da UFMG. Belo Horizonte: 2018 (online).

ROCHA, S.S.D. O Uso do Computador na Educação: A Informática Educativa. Revista Espaço Acadêmico. N° 85. Junho de 2008. Ano VII. Disponível em <http//: www.revistaespacoacademico.com.br> Acesso em 12.05.2022.

______. Processos Formativos e a Constituição da Docência Online: O Universo Paralelo de Alice. Dissertação apresentada ao programa de Pos-graduação em Educação da Universidade  Estadual do Ceará, 2013. p.201.

SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia: teorias da educação, curvatura da vara,

onze teses sobre educação e política. 13. ed. Campinas, SP: Cortez Editora/ Autores

Associados, 1986. 96 p. (Coleção polêmicas do nosso tempo, v. 5).

SAVIANI, Dermeval. História das ideias pedagógicas no Brasil. Autores Associados, 2010.

SOBRAL, C. A. S.; ARAÚJO, M.S.; GONÇALVES, R.M. Do paradigma da formação das escolas normais no Brasil aos paradigmas da formação de professores na contemporaneidade. South American Journal, Rio Branco, Acre, 15 jul. 2019.

marcosrocha

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*